21 de março de 2009

Big Brother Brasil

Apresentação
Os comentários de Miguel Reale Júnior postados a seguir retratam o que está à vista de todos: a indigência cultural, moral e religiosa do cenário nacional. O que terá produzido essa degradante situação?

Bem se vê que tal crise ultrapassa os limites culturais, penetra a fundo na esfera do comportamento moral e chega até às raízes religiosas. Há quarenta anos o que se vê nos sermões da Igreja progressista no Brasil é a pregação ad nauseam do amor humano – que facilmente resvala para o amor sensual e deste para o carnal. Juntamente com o amor, pregou-se nos púlpitos a idolatria da comunidade, da assembléia, do social. Na nova religião tudo é válido se feito em nome do amor, em comum ou aceito por todos. Nos confessionários foi amplamente praticada a tolerância e a aceitação dos novos costumes. O sagrado foi substituído pelos valores humanos em moda, mais flexíveis que os caniços de bambu.

Na escola e no lar passou-se um fenômeno análogo. A formação religiosa, moral e social de outrora evanesceu. Apresentaram-se substitutivos: a preservação do meio ambiente, a solidariedade, a cidadania e o mais. Os novos valores não tiveram o condão de impedir a demolição ou de empreender a reconstrução.

O amor e a vida grupal constituem os dois ingredientes mais fortes do programa Big Brother Brasil desde a sua primeira edição. A instituição familiar não é frontalmente atacada, mas só um cego não vê que ali é demolida em seus alicerces. O pudor – tão valorizado nos tempos do heróico cardeal Von Galen, como vimos em artigo aqui reproduzido[1]– parece cada vez mais algo tão fora de moda como os salões das marquesas francesas do Antigo Regime.

A quem questione a inserção da opinião de Miguel Reale Júnior neste site – por considerá-la demasiado chocante em sua crueza analítico-descritiva, ou por não perceber um nexo dela com a idéia-mestra da sacralidade – é preciso responder: o Brasil de hoje é como o filho pródigo da parábola do Evangelho. Abandonou as vias da civilização cristã e entregou-se ao pior espírito de seu tempo. Perdeu seu valor como uma moeda que rola pelo chão e cai na sarjeta. Enquanto não alcançar plena consciência e vergonha de seu estado vil, não sentirá saudades da casa paterna. A apetência de sacralidade só ressurgirá quando houver um imenso, generalizado e definitivo enfado.
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Big Brother Brasil
Por Miguel Reale Júnior
Programas como Big Brother indicam a completa perda do pudor, ausência de noção do que cabe permanecer entre quatro paredes. Desfazer-se a diferença entre o que deve ser exibido e o que deve ser ocultado. Assim, expõe-se ao grande público a realidade íntima das pessoas por meios virtuais, com absoluto desvelamento das zonas de exclusividade. A privacidade passa a ser vivida no espaço público.

O Big Brother Brasil, a Baixaria Brega do Brasil, faz de todos os telespectadores voyeurs de cenas protagonizadas na realidade de uma casa ocupada por pessoas que expõem publicamente suas zonas de vida mais íntima, em busca de dinheiro e sucesso. Tentei acompanhar o programa. Suportei apenas dez minutos: o suficiente para notar que estes violadores da própria privacidade falam em péssimo português obviedades com pretenso ar pascaliano, com jeito ansioso de serem engraçadamente profundos.

Mas o público concede elevadas audiências de 35 pontos e aciona, mediante pagamento da ligação, 18 milhões de telefonemas para participar do chamado "paredão", quando um dos protagonistas há de ser eliminado. Por sites da internet se pode saber do dia-a-dia desse reino do despudor e do mau gosto. As moças ensinam a dança do bumbum para cima. As festas abrem espaço para a sacanagem geral. Uma das moças no baile funk bebe sem parar. Embriagada, levanta a blusa, a mostrar os seios. Depois, no banheiro, se põe a fazer depilação. Uma das participantes acorda com sangue nos lençóis, a revelar ter tido menstruação durante a noite. Outra convivente resiste a uma conquista, mas depois de assediada cede ao cerco com cinematográfico beijo no insistente conquistador que em seguida ridiculamente chora por ter traído a namorada à vista de todo o Brasil. A moça assediada, no entanto, diz que o beijo superou as expectativas. É possível conjunto mais significativo de vulgaridade chocante?

Instala-se o império do mau gosto. O programa gera a perda do respeito de si mesmo por parte dos protagonistas, prometendo-lhes sucesso ao custo da violação consentida da intimidade. Mas o pior: estimula o telespectador a se divertir com a baixeza e a intimidade alheia. O Big Brother explora os maus instintos ao promover o exemplo de bebedeiras, de erotismo tosco e ilimitado, de burrice continuada, num festival de elevada deselegância.

O gosto do mal e mau gosto são igualmente sinais dos tempos, caracterizados pela decomposição dos valores da pessoa humana, portadora de dignidade só realizável de fixados limites intransponíveis de respeito a si própria e ao próximo, de preservação da privacidade e de vivência da solidariedade na comunhão social. O grande desafio de hoje é de ordem ética: construir uma vida em que o outro não valha apenas por satisfazer necessidades sensíveis.

Proletários do espírito, uni-vos, para se libertarem dos grilhões da mundialização, que plastifica as consciências.
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[1]
O Leão de Münster e Pio XII

Miguel Reale Júnior, advogado, professor titular da Faculdade de Direito da USP, membro da Academia Paulista de Letras.
Artigo publicado em 02.02.2009 no jornal O ESTADO DE SÃO PAULO.

Não há quem chore pelas criancinhas

Reproduzo um dos mais reveladores artigos publicados sobre a posição da Igreja em relação ao aborto feito pelos médicos na garota de 9 anos estuprada pelo padrasto. LM.

Por Dom Lourenço Fleichman OSB
Bastou um bispo agir segundo a lei da Igreja e o mundo desabou numa enxurrada de blasfêmias e xingamentos. A mídia com sua supremacia apresenta a coisa com essa presunção típica de quem se acha todo-poderosa. Dom José Sobrinho virou carrasco, quando o crime foi cometido por terceiros.
Eis o quadro que se apresenta a qualquer pessoa de bom senso:

1 - O bispo que confirmou a excomunhão automática por aborto era a autoridade competente para emitir essa sentença?Constata-se que a pena de excomunhão ou a declaração dela é da competência do pastor eclesiástico das pessoas envolvidas. Nesse caso, o bispo diocesano ou o seu superior direto, o papa. Como é do conhecimento geral que Dom Sobrinho é o Arcebispo de Recife-Olinda, estamos, sim, diante da autoridade competente.

2 - O ato praticado pelas pessoas ora declaradas excomungadas é, de fato, passível dessa grave pena, ou foi invenção do bispo?De fato, o Direito da Igreja, chamado Direito Canônico, aplica a excomunhão automática, também chamada latae setentiae, para as pessoas que praticam ou que colaboram diretamente no ato de aborto.

3 - Mas o Direito Canônico não traz algumas exceções, como o caso do estupro ou perigo de vida para a mãe? Não, o Direito Canônico não aceita que haja exceções por causa da natureza própria desse ato, que é atentar diretamente contra a vida de seres inocentes. Mas aqui, estamos já entrando no mérito da questão, e preferimos deixar a discussão para mais adiante.

O que é preciso enxergar por enquanto é que, de um lado, temos duas criancinhas mortas. Querendo dar a essa morte conotação de crime ou não, o fato é que elas não pediram para nascer, para ter uma alma imortal, para ter um olhar amoroso de Deus diante da sua criação. E sem culpa alguma, tiveram esse projeto de vida divino interrompido bruscamente por envenenamento. E do outro lado, o que temos? um bispo que cometeu algum crime? Um bispo que matou alguém, um bispo que fugiu completamente das suas atribuições para condenar alguém sobre quem ele não tem nenhuma autoridade? Nada disso. Temos apenas um bispo cumprindo o seu dever diante de Deus e diante das leis da instituição que ele representa. Um bispo declarando uma pena que é automática e que já tinha fulminado os responsáveis antes mesmo de o bispo o declarar.

Essa gente não tem nada que ver com isso

No fundo, o mundo não tem nada com isso. Essas pessoas excomungadas não foram presas, não foram demitidas do trabalho, nem prejudicadas em nada em sua vida natural. Apenas, tendo feito um ato que fere a legislação moral da Igreja, receberam a pena prevista no Direito. O que esses jornalistas têm que ver com isso? Com que direito se levantam para condenar? Eles sim é que não têm autoridade nem competência para tratar desse assunto. Deviam ficar calados, mas a perseguição contra os critérios naturais que regem a moral católica leva-os a participar desse massacre à Igreja.

Sabem o que esses intelectuais queriam? Queriam que o bispo agisse como nossos políticos e nossos juizes. Assistem impunemente a toda sorte de crimes previstos pelas leis dos homens, mas não os condenam porque têm interesses paralelos inconfessáveis. O que significa uma autoridade assistir a um ato que fere as regras da sua instituição e não aplicar a pena? No mínimo, negligência; no geral, corrupção. E Dom José Sobrinho escapou dos dois erros ao levantar sua voz de pastor e pai, que castiga o filho para atrair a sua conversão.

Quais são, portanto, os princípios morais que estão em jogo? Qual o mérito da questão? Por que razão não se pode dar a uma mulher o direito de matar os filhos em seu ventre?

Não matarás!

Senhores, donos dos holofotes da mídia, desviem o foco do bispo e da menina que fez o aborto. Dirijam a luz dos seus holofotes poderosos para onde está o ponto principal: Duas criancinhas foram mortas. Ponto. Ah! sim, vocês não querem ouvir isso, eu sei. Essa verdade luminosa fere os ideais de vocês. Por isso é preciso jogar toda a atenção dos homens em cima do bispo e em cima da mãe, pois assim as pessoas desviam sua atenção do crime atroz: DUAS CRIANCINHAS FORAM MORTAS. Se elas tivessem vindo à luz, se fossem bebês bonitinhos, com xuquinha no cabelo e hypogloss no bumbum, os jornalistas encabeçariam a campanha contra a mãe má que matou seus filhos. Não foi assim com a mulher que jogou seu bebê na lagoa, e tantos outros casos dados nos jornais? Mas as pobrezinhas de hoje estavam na barriga da mãe, então perderam o favor dos intelectuais e da mídia.

Entra, então a questão desses falsos intelectuais que fazem tudo, menos usar a inteligência. São mestres em mover as paixões e formar a opinião pública em cima de slogans e palavras de ordem. Eles dirão que só existe pessoa humana depois do nascimento. Vejam como a coisa funciona. Se está no útero, não é gente. Aí, um dia, sem que aconteça nenhuma modificação essencial na constituição daquele “bicho”, ele sai da sua primeira morada. Grande mágica! Passou a ser gente porque um bando de intelectuais e políticos determinou que, naquela hora, o mesmo ser que era bicho se transformou em pessoa humana. Essa é a enganação desses hipócritas. Se um médico sério, cientista, usando os critérios próprios do seu saber, mostrar para eles que é tudo igual naquele ser, antes de vir à luz e depois, isso para eles não importa e de tudo farão para esconder essa evidência da população. O que importa é que eles têm o poder de transformar bicho em gente. Estamos no mundo da MITOLOGIA pura e simples.

A fonte desse poder está no desaparecimento da Lei Natural e do Direito Natural da mente das pessoas. A coisa é grave. Basta ler as manifestações dos leitores dos grandes jornais para se perceber que a população já não usa mais a inteligência. Seguem direitinho a cartilha dos intelectuais, usando os sentimentos e as paixões no lugar do raciocínio. Para o mundo moderno e apóstata, se uma coisa é legal, juridicamente falando, então essa coisa pode e deve ser realizada. É evidente que isso é falso, pois uma coisa pode ser legal, levada à legalidade pela lei de homens maus, com intenções escusas. Ferirá a lei de Deus, a lei que Deus impôs à natureza que Ele criou, e por isso não poderá prevalecer, mesmo que goze do favor dos juizes, dos políticos, da mídia e de quem quer que seja. Mas basta um olhar superficial sobre o que está acontecendo com o nosso mundo, para se perceber que os homens dão os últimos retoques na construção de um mundo novo, sem a natureza humana, sem a família humana, sem os critérios de bem e de mal que são necessários em qualquer sociedade. E se os intelectuais baseiam seus atos num Direito positivista que eles mesmos criaram, determinando que o bem e o mal ficam limitados ao que foi aprovado pelo Congresso, por que razão não aceitam que a Igreja também determine o bem e o mal por sua legislação? Dois pesos e duas medidas. Ou, em outros termos, ditadura do pensamento e da opinião.
Então, se a Lei Natural diz: Não matarás, significando que ninguém tem o direito de atentar contra a vida de inocentes, eles respondem: não conhecemos essa lei e esse Deus. Só conhecemos a lei que passou no Congresso. E ela diz que a criancinha que está no útero da mãe é bicho e não é gente. E saem por aí massacrando milhões de inocentes todos os anos. Malditos!

Muito bem, lá estão eles, cheios de si, apontando o dedo contra o bispo que cumpriu seu dever. Como argumentação principal, dizem que o assassinato das duas criancinhas é justificado por causa do risco de vida da mãe. É impressionante a lógica dessa gente: uma menina de nove anos talvez morra.... vamos matar os seus dois filhos inocentes para que ela não morra. Literalmente é jogar fora o bebê com a água do banho.... Ora, se todos os católicos são obrigados a crer em Deus Criador, no fim último de nossas almas imortais, é preciso também crer na existência da alma espiritual, que é criada por Deus no momento da concepção. Existe na natureza, patente em muitos animais, um instinto de preservação da espécie. No caso humano, nós não somos movidos pelo instinto, mas sim pela racionalidade, que engloba o conhecimento, pela inteligência, e o reto agir, pela vontade. Se Deus fez com que animais irracionais tivessem o instinto de preservação, quanto mais não fez ele para com a preservação da espécie humana, que é o centro de suas atenções e dos seus amores. O fato de uma gravidez ser provocada por estupro não muda em nada o fato de que o resultado da gravidez é um ser humano, com um destino dentro do amor de Deus. Uma vez realizada a primeira divisão celular, Deus assume o controle daquela criancinha, porque sopra sobre ela uma alma imortal. Já não pertence totalmente à mãe. É Dele, passa a fazer parte da história de amor que liga o próprio Criador com sua criatura, e que vai levar esses frágeis seres a encontrar, no Céu, a luz divina, para sempre. Essas razões expostas aqui servem para mostrar que a única atitude possível diante de uma mulher que corre o risco de vida em sua gravidez é usar a técnica e a ciência para tentar salvar tanto a mãe quanto as crianças. Hora nenhuma é permitido atropelar a natureza no sentido de interromper a vida, pois ela pertence a Deus. E se acontecer da medicina não conseguir salvar os dois, caberá à natureza seguir o seu curso, sem que ninguém possa opor-lhe um obstáculo. Deus chama para Si, na hora que ele só conhece, os filhos que Ele mesmo criou. Os senhores ministros e presidentes, donos de jornais e escritores, discordam disso? Nada muda nas leis santas da Igreja, que emanam da autoridade do Criador. Discordem e mudem de canal, pois de nada adianta fazer intrigas e ameaças pelos jornais.

Mas a maldade da mídia vai além. Agora eles inventaram de brigar com o bispo porque não excomungou o padrasto. Mais um motivo para forçarem a opinião pública por meio de sentimentalismos. Acusam a Igreja de não excomungar o padrasto como quem diz... estão defendendo o homem mau! Hipócritas! Eu vou explicar, apesar de que eles não estão interessados em explicações, mas pode servir para alguém de boa vontade. É evidente que o padrasto cometeu um pecado grave, mortal, que o levará para o inferno se não se arrepender antes da morte. Mas ser excomungado ou não, não depende da vontade do bispo. Como ficou explicado no início, a excomunhão é uma pena prevista pelo Direito da Igreja. Ela é prevista para aqueles que matam criancinhas inocentes antes do nascimento e não é prevista para os abusos sexuais. Por quê? Pelo fato de que não há ninguém no mundo que possa vir em defesa dos inocentes assassinados. Por isso a Igreja acrescenta a pena social de excomunhão à pena interior que, por si só, já levaria alguém para o inferno. No caso de outros pecados mortais a Igreja considera que basta a condenação ao inferno, se a pessoa não se arrepender. Não gostou, senhor ministro? Pois fique sem gostar: essa é a lei da Igreja e o senhor não tem nada com isso.

19 de março de 2009

O deus dos palpiteiros

Se há um Deus onipotente, onisciente e onipresente, é óbvio que não podemos conhecê-Lo como objeto, ou mesmo como sujeito externo, mas apenas como fundamento ativo da nossa própria autoconsciência, maximamente presente como tal no instante mesmo em que esta, tomando posse de si, se pergunta por Ele. Tal é o método de quem entende do assunto, como Platão, Aristóteles, Sto. Agostinho, S. Francisco de Sales, os místicos da Filocalia, Frei Lourenço da Encarnação ou Louis Lavelle.

Quando um Richard Dawkins ou um Daniel Dennett examinam a questão de um “Ser Supremo” que teria “criado o mundo” e chegam naturalmente à conclusão de que esse Ser não existe, eles raciocinam como se estivessem presentes à criação enquanto observadores externos e, pior ainda, observadores externos de cuja constituição íntima o Deus onipresente tivesse tido a amabilidade de ausentar-se por instantes para que pudessem observá-Lo de fora e testemunhar Sua existência ou inexistência. Esse Deus objetivado não existe nem pode existir, pois é logicamente autocontraditório. Dawkins, Dennett e tutti quanti têm toda a razão em declará-lo inexistente, pois foram eles próprios que o inventaram. E ainda, por uma espécie de astúcia inconsciente, tiveram o cuidado de concebê-lo de tal modo que as provas empíricas da sua inexistência são, a rigor, infinitas, podendo encontrar-se não somente neste universo mas em todos os universos possíveis, de vez que a impossibilidade do autocontraditório é universal em medida máxima e em sentido eminente, não dependendo da constituição física deste ou de qualquer outro universo.

Se você não “acredita” no Deus da Bíblia, isso não faz a mínima diferença lógica ou metodológica na sua tentativa de investigar a existência ou inexistência d’Ele, quando essa tentativa é honesta. Qualquer que seja o caso, você só pode discutir a existência de um objeto previamente definido se o discute conforme a definição dada de início e não mudando a definição no decorrer da conversa, o que equivale a trocar de objeto e discutir outra coisa. Se Deus é definido como onipotente, onisciente e onipresente, é desse Deus que você tem de demonstrar a inexistência, e não de um outro deus qualquer que você mesmo inventou conforme as conveniências do que pretende provar.

O método dos Dawkins e Dennetts baseia-se num erro lógico tão primário, tão grotesco, que basta não só para desqualificá-los intelectualmente nesse domínio em particular, mas para lançar uma sombra de suspeita sobre o conjunto do que escreveram sobre outros assuntos quaisquer, embora seja possível que pessoas incompetentes numa questão que julgam fundamental para toda a humanidade revelem alguma capacidade no trato de problemas secundários, onde sua sobrecarga emocional é menor.

Longe de poder ser investigado como objeto do mundo exterior, Deus também é definido na Bíblia como uma pessoa, e como uma pessoa sui generis que mantém um diálogo íntimo e secreto com cada ser humano e lhe indica um caminho interior para conhecê-La. Só se você procurar indícios dessa pessoa no íntimo da sua alma e não os encontrar de maneira alguma, mesmo seguindo precisamente as indicações dadas na definição, será lícito você declarar que Deus não existe. Caso contrário você estará proclamando a inexistência de um outro deus, no que a Bíblia concordará com você integralmente, com a única diferença de que você imagina, ou finge imaginar, que esse deus é o da Bíblia.

Quando o inimigo da fé faz um esforço para ater-se à definição bíblica, ele o faz sempre de maneira parcial e caricata, com resultados ainda piores do que no argumento da “criação”. Dawkins argumenta contra a onisciência, perguntando como Deus poderia estar consciente de todos os pensamentos de todos os seres humanos o tempo todo. A pergunta é aí formulada de maneira absurda, tomando as autoconsciências como objetos que existissem de per si e questionando a possibilidade de conhecer todos ao mesmo tempo ex post facto. Mas a autoconsciência não é um objeto. É um poder vacilante, que se constitui e se conquista a si mesmo na medida em que se pergunta pelo seu próprio fundamento e, não o encontrando dentro de seus próprios limites, é levado a abrir-se para mais e mais consciência, até desembocar numa fonte que transcende o universo da sua experiência e notar que dessa fonte, inatingível em si mesma, provém, de maneira repetidamente comprovável, a sua força de intensificar-se a si próprio. Dez linhas de Louis Lavelle sobre este assunto, ou o parágrafo em que Aristóteles define Deus como noesis noeseos, a autoconsciência da autoconsciência, valem mais do que todas as obras que Dawkins e Dennett poderiam escrever ao longo de infinitas existências terrestres. Um Deus que desde fora “observasse” todas as consciências é um personagem de história da carochinha, especialmente inventado para provar sua própria inexistência. Em vez de perguntar como esse deus seria possível, sabendo de antemão que é impossível, o filósofo habilitado parte da pergunta contrária: como é possível a autoconsciência? Deus não conhece a autoconsciência como observador externo, mas como fundamento transcendente da sua possibilidade de existência. Mas você só percebe isso se, em vez de brincar de lógica com conceitos inventados, investiga a coisa seriamente desde a sua própria experiência interior, com a maturidade de um filósofo bem formado e um extenso conhecimento do status quaestionis.

O que mata a filosofia no mundo de hoje é o amadorismo, a intromissão de palpiteiros que, ignorando a formulação mesma das questões que discutem, se deleitam num achismo inconseqüente e pueril, ainda mais ridículo quando se adorna de um verniz de “ciência”.
Por Olavo de Carvalho. Diário do Comércio, 18 de março de 2009.

Pe. Paulo Ricardo e aborto

A oportuna homilia do Pe. Paulo Ricardo sobre a polêmica do aborto na menina de nove anos.
O link: http://www.padrepauloricardo.org/download/homilia-aborto.mp3.

8 de março de 2009

Sobre o aborto feito na menina grávida de gêmeos

A Imprensa tem divulgado que o Sr. Arcebispo de Olinda e Recife, D. José Cardoso Sobrinho excomungou as pessoas que praticaram o aborto na menina de 9 anos de idade estuprada pelo padrasto. Na verdade, o Sr. Arcebispo não aplicou a pena de excomunhão aos que praticaram o aborto, ele apenas avisou que essas pessoas estavam excomungadas pelo “Código de Direito Canônico”, que prevê a excomunhão "latae sententiciae" (cânon 1398), ou seja, automática, para quem pratica o aborto ou colabora com a sua execução. Portanto, não se ponha o peso da decisão no Sr. Arcebispo, mas sim no Código de Direito Canônico aprovado pelo Papa João Paulo II, em 1983.
A Igreja não aceita o aborto em caso algum, nem mesmo em caso de estupro ou má formação congênita, porque o dom da vida só pode ser tirado por Deus. Apenas no caso de legítima defesa da vida, quando não há outra alternativa, pode-se tirar a vida do agressor injusto; nem de longe é o caso ocorrido com a menina. Jamais um feto pode ser taxado de agressor.
Os médicos poderiam ter tratado da menina com tudo o que a medicina tem de recursos, mas jamais matar as crianças. Se a criança no ventre da mãe vier a morrer por efeito secundário devido a um tratamento aplicado à mãe, nesse caso não há pecado, pois não se quis voluntariamente matar a criança.
Será que os médicos avaliaram se a menina poderia gerar os filhos e dá-los à luz, mesmo com o auxílio da cesariana? Sabemos que um feto pode sobreviver hoje fora do útero até com cerca de 400 gramas.O aborto é uma violência inaudita que a Igreja considera um pecado gravíssimo, a ser punido com a pena máxima de excomunhão; brada justiça ao céu.
Um erro não justifica cometer outro; quem deveria ser punido é o estuprador e não as crianças gêmeas; o juiz deve punir o réu culpado e não as vítimas; dessa forma a Justiça age às avessas.
Prof. Felipe Aquino. Fonte Cléofas.